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sábado, 3 de agosto de 2024

13 anos: sorte ou azar?


Levantou-se da cama, arrastada, após mais uma noite em branco. Já lhes perdera a conta.

Uma semana? Duas? Um mês? A vida toda sem dormir? Não sabia. Apenas sentia que estava a ser consumida pela angústia. As crises de ansiedade repetiam-se a cada respirar e, por dentro, as suas entranhas estavam remexidas, ao ponto de o estômago apertado e dorido não sair da boca - um simples copo de água causava-lhe uma dor aguda, como se fosse apedrejada no interior.

Era o seu estado "normal" desde, há pelo menos, um ano. Como era possível? Era. E, ora caía em lágrimas  escondidas ou disfarçava com o melhor sorriso. 

A decisão há muito estava tomada, mas faltava-lhe a coragem para dar o passo que faltava. O seu tempo - que se tinha imposto a si própria - estava a esgotar-se e o que sentia como sendo cobardia, aguçava ainda mais aquela dor que estava a acabar com ela.

Foi neste estado que percorreu o caminho que sabia de cor, sempre acompanhada de uma voz. Tens de fazer isto. De hoje não passa. Cada quilómetro lhe parecia mais difícil. Talvez fosse mais simples desaparecer do mapa e nunca mais lá por os pés, contudo essa não era a solução para esta equação de vida.

A meio da manhã, o telefone tocou. Estou cá! Almoçamos juntos? Sabia, exactamente onde o encontrar. Já era hábito. Uma espécie de rotina. Uma lufada de ar fresco naqueles tempos infernais. Não. Hoje não posso. Vou fazer algo muito importante. Falamos depois, sim? 

E poucos minutos depois chegara a hora. Num acto de coragem - ou teria sido desespero? - comunicou na voz mais clara que as dores lhe conseguiam dar. Vou-me embora. Tenho outros planos para mim. Do outro lado a surpresa e estupefacção. Não se deixou comover. Aliás, já nada a comovia. 

Já lá vão treze anos. Foi o seu grito de liberdade rumo ao desconhecido. Nem uma vez se arrependeu de ter fechado aquele portão dourado. 

Hoje, o sorriso que disfarçava a dor deu lugar a um mais feliz. Por vezes cansado. Exausto. Porém sem dor.