quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Sobre livros e revistas


Normalmente não abordo aqui assuntos que possam causar controvérsia, pois se por um lado sei que há por aí uns haters sempre com a arma apontada, por outro tenho consciência que toda a gente tem telhados de vidro, inclusivamente eu, mas hoje não posso ficar calada e o assunto que me traz aqui não é nada mais, nada menos que livros e revistas de crafts e lifestyle.
Podia começar com um ditado dizendo que a "galinha da vizinha é melhor que a minha", mas prefiro substituir a galinha por um ovo, tomando este como um produto da galinha - e que me perdoem as pobres das aves que não têm nada a ver com isto.
Se antigamente comprava muitas revistas, o tempo, o dinheiro e sobretudo a minha - como dizer - esquisitice fizeram com que abrandasse o ritmo para um quase "parado". A verdade é que sempre comprei revistas francesas, espanholas, italianas e algumas brasileiras, tudo porque não havia publicações portuguesas de crafts. Neste momento compro apenas a versão inglesa da Flow (que sai de 3 em 3 meses) e há dias encontrei por mero acaso e "veio agarrada às minhas mãos" a deliciosa revista  Mr Wonderful Ideas. Quanto às portuguesas, que actualmente enchem as bancas dos quiosques, não compro nem uma. E porquê?

1º - estando desde sempre habituada a revistas estrangeiras e tendo vivido no Reino Unido onde há imensas publicações maravilhosas (ok, também há algumas que não valem o papel que usam...), as que se fazem cá não me satisfazem
2º - olho para as publicações portuguesas e só me ocorre um "que horror!" e que abrange não só as peças lá publicadas (é sempre mais do mesmo), o styling das fotos que é de fugir, o papel, as fontes de escrita... - atenção, respeito quem goste, quem as produz e quem reproduz os trabalhos lá publicados: antes fazer alguma coisa do que não fazer nada
3º - soa-me tudo a dejá vu e tenho quase a certeza que se revirasse o Google encontraria lá cada um daqueles projectos ditos "originais"
4º - não me trazem nada de novo, nenhum valor acrescentado - n.a.d.a. Mil vezes o Pinterest onde a inspiração é de melhor qualidade e onde há moldes e tutoriais aos ponta-pés de download gratuito
5º - quanto aos livros de crafts portugueses - salvo duas ou três excepções - aplicam-se as mesmas regras. 

Enquanto vivi em Londres lembro-me de passar horas a fio na Waterstones de Picadilly, na secção de livros de crafts e ficar deliciada com cada um que tirava da prateleira: os projectos até podiam ser simples e enquadrar.se no tal "mais do mesmo", mas o papel, as fotografias, o modo como estavam escritos  - de uma forma simples e sem pretensiosismos - tornavam-nos apetecíveis e quase obrigatórios. Com as revistas acontecia o mesmo: vi crescer a Mollie Makes e nascer a The Simple Things, por exemplo, e mesmo quando não as comprava ficava maravilhada com a quantidade de informação que continham: links, lojas, marcas, técnicas, ...

E perante isto vou contar-vos algo  que nunca disse em público: quando regressei de Londres trouxe comigo um rascunho de um livro que sonhava publicar. Inspirada por tudo o que tinha absorvido no último ano e meio e dada a inexistência de algo semelhante no mercado nacional resolvi contactar mais que uma editora para apresentar o projecto. A resposta foi sempre a mesma: " ah, é interessante, mas não temos verba". Ok! Aceitável. Como se justifica, então, a posterior publicação de livros - aos magotes - de qualidade tão duvidosa? Provavelmente o meu nunca iria para a frente, pois com as minhas esquisitices, qualquer editora teria desistido. Digo eu. Sei lá... Ou então teria de me redimir às exigências da editora e o produto final não teria nada a ver com o que eu idealizara e seria algo bizarro - com o bónus de vir num saco de organza  brilhante atado com uma fita de seda

Não sei se algum dos leitores do Pano p'ra Mangas está ligado ao mundo editorial - quer de revistas, quer de livros, mas se sim deixo no ar as seguintes questões:
- Porque é que as nossas publicações são tão pobrezinhas comparadas com muito do que se faz no resto da Europa?
- Não há verbas? Para fazer algo melhor é preciso mais dinheiro? E se em vez de publicarem dez revistas iguais, publicassem uma de boa qualidade - que desse prazer comprar, folhear até à exaustão, dormir com ela debaixo da almofada...
- Não há vontade? Porquê? De uma coisa eu tenho a certeza que Portugal de lés a lés não carece: gente talentosa, gente criativa, bons ilustradores, bons designers, bons fotógrafos, bons t.u.d.o!
- Não sabem como fazer? Aprendam! Comecem por imitar - sim, eu disse imitar!!! que é assim que aprendemos tudo na vida: desde o andar, ao falar e ao escrever - adquiram algumas das revistas de que vos falei há pouco e outras tantas, vejam como estão feitas, percebam como se podem adaptar ao nosso público e quem sabe daqui a algum tempo não haverá uma destas publicações traduzida em duas ou três línguas e a viajar pelo mundo.
- Porque é que revistas tão boas como a Blue Cooking ou a Blue Living desapareceram? Sim, eram portuguesas. Sim, eram muito boas. Sim, para quem as guarda continuam a ser uma delícia: a nível de conteúdo, a nível gráfico, a nível de fotografia...
- Pensem grande! Dêem passos pequenos! Um de cada vez. Um atrás do outro. Até ao dia em que o passo seja tão grande quanto o sonho e o desejo de dar o que têm de melhor. 

A época dos Descobrimentos foi há mais de cinco séculos. Os baús de ouro e especiarias já não nos chegam em galeões nem em caravelas. No entanto continuamos encostados a uma glória que já não é vivida, pertence ao passado, e em vez de continuarmos a pensar em grande, pensamos tão pequenino que somos engolidos pelos maiores...

Já vai longo este post. Um post rabugento, mas que me está preso nas mãos há muito tempo.

Pano p'ra Mangas
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10 comentários:

  1. Bom dia Margarida
    Aplaudo o teu post com todo o gosto. Tens toda a razão... Também antigamente comprava muitas revistas de "artesanato", quando comecei nestas andanças e ainda não sabia como fazer certas coisas. Infelizmente as publicações portuguesas são mais do mesmo em todos os aspectos e as publicações estrangeiras (boas) não existem em todos os quiosques ao virar da esquina. Também eu vou ao pintarest, ao instagram em busca de inspirações.
    Mas é uma pena que continuemos com a mesma vidinha de sempre, sem vontade de andar para a frente, a culpar os outros pelas nossas faltas e a lamentar o estado das coisas (mas sem vontade de mexer uma unha do pé para mudar).
    Felizmente há sempre gente para agitar as águas. Gosto de te ler.
    Beijocas
    Marta
    http://pitinhosdamarta.blogspot.pt/

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  2. Oh Margarida!
    Tenho andado pouco "passeante"pelo FB, mas hoje, ao abri-lo, foi esta a 1ª notícia que li e não podia deixar de botar faladura!
    Que me perdoem "os ovos maizas galinhas" e honrando as excelentes excepções, concordo em absoluto contigo.
    E mais não digo - não é preciso :)
    bjs e boa semana.

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  3. Ai as " BLUES"....as melhores revistas de sempre em Portugal!! E ainda a Blue Travel, preciosa como as outras.
    Como foi possível a sua extinção?? Eu tb ainda guardo cada uma delas, tudo no seu interior é 100% fantástico, não havia desperdício de folhas, um conteúdo 5*****
    Olha e que tal um crowdfunding para o teu projecto ?? Acredito que ias ter muitos e muito apoiantes!!
    Vá põe lá este projecto no topo das 5 melhores ideias, boa?!
    Beijos em ti!

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  4. Não me parece nada rabugento mas sim bastante pertinente :)
    Tocaste em alguns dos traços mais irritantes que nos caracterizam - o "que vem de lá fora é sempre melhor" e o "nosso mercado é demasiado" pequenino. Os dois, tristemente, acabam por se tornar realidade.
    Concordo contigo. Menos é mais. E porque não pensar numa revista portuguesa que possa ser exportada? E o Brasil? Mundo das crafters e com milhões de leitores que nem exigiriam os custos de tradução? Há tantas alternativas.
    Esperemos que por aqui ande alguma editora interessada em fazer coisas bonitas e que não resista a este chamamento :))

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  5. Porque é que não posso deixar de concordar contigo? Fico tão pouco entusiasmada com as revistas daqui que já me passou pela cabeça criar uma.
    É por isso que não compro revistas, ou esporadicamente compro alguma que me tenha chamado à atenção.
    Fiquei curiosa sobre a The Simples Things, provavelmente só a encontro na Fnac não é?

    Beijinhos

    http://bonjourrose.blogspot.pt/

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    Respostas
    1. Beatriz, não sei onde vive, mas se está em Lisboa, quase de certeza a encontrará num quiosque na Rua do Loreto (Chiado), o qual fica no lado direito vindo do Largo de Camões. 😄 Essa e muitas outras maravilhosas!!!!

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  6. Ainda bem que escreveste este post, é necessário debatermos sobre este assunto pois realmente é muito triste o que se passa no nosso país. Deduzo que as revistas blues que nunca tive o prazer de conhecer, deixaram de existir porque por mais crafters tenhamos em Portugal, o que rende e vende são revistas cor-de-rosa, com noticias escandalosas e ao preço da chuva.

    Entendo-te muito bem pois também morei fora um ano, neste caso nos EUA e não podia ir a uma livraria que trazia logo um livro ou dois, acabei por comprar uma mala para trazer de volta só mesmo para os livros DIY!! Isto há uns 7 anos quando o pinterest nem existia e o facebook era um bebé. Só a capa já ficavas a babar e depois esfolheavas e o design e fotos eram tão apelativas que cheguei a comprar dois livros de feltro só para inspiração de tão bonitos que eram (fiz alguns trabalhos em feltro mas nunca foi o meu material predileto)

    Ainda este ano quando tive no Brasil queria comprar as revistas craft todinhas mas contive-me bastante e apenas comprei o livro "Presentes Artesanais" da Publifolha pois era deslumbrante, o preço apelativo e claro, não iria encontrar nada disto em Portugal. Em Novembro vou por muitos desses projetos em pratica para o Natal!

    Nunca comprei nenhuma revista craft em Portugal porque achava que não tinha qualidade alguma. A minha mãe costumava comprar a revista com projetos em trapilho e eu achava aquilo tão horrivel... os projetos eram criativos e giros mas a escrita era pessima e as fotos nem se fala!

    Sem dúvida que adorava fazer parte de uma revista com qualidade em português! E penso que se ainda tens a energia deverias ir em frente com o teu livro, de forma autonoma, não é assim tão custoso e pelo que te acompanho (já são uns 7 anos, desde que vivia nos EUA, tempos do flickr), sempre gostei muito dos teus produtos craft repletos de bom gosto. Força!

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  7. Oh Margarida, que bom ler este post! Nunca o conseguiria escrever de melhor maneira. Já aqui falou mais ou menos sobre isto há uns meses, onde por acaso eu também não resisti a comentar e até partilhei o meu interesse pela Taproot. E dá-me tanta pena não sermos capazes de produzir algo do género. Ou melhor, claro que somos capazes, apenas não temos o apoio necessário. O porquê, não sei, porque realmente há por cá tantas e tantas revistas, que não acredito ser o motivo financeiro o travão para avançar com algo de qualidade. Por vezes chego a pensar que o que é feito, é feito para as massas, porque é isso que é lucrativo, mas é algo que me entristece imenso, porque então se as massas reflectem a nossa sociedade, suspiro... realmente então não há lugar para revistas de qualidade. Não seriam apreciadas, compreendidas, acalentadas como fazemos com as que gostamos. Mas muitas vezes acho que é tudo uma questão de tempo. Uma questão de haver um grupo de pessoas com o mesmo interesse, que se conhecem, juntam e resolvem arriscar. Para descobrirem depois que há outro grupo, imenso, que estava apenas à espera que esse sonho arriscado passasse à acção. Enfim, pensamentos... Continuo a dar-lhe os parabéns pelas suas fotos, pelo seu trabalho, pela sua partilha aqui. Acompanho-a sempre, com admiração e orgulho.

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  8. ´Sou mais uma a concordar contigo...também fiz esse percurso de progressivamente deixar de comprar as tais revistas de mais do mesmo...e infelizmente muito pobres em tudo...O que acho estranho é o facto de elas se continuarem a vende. Como é que é possível penso muitas vezes ao passar nos quiosques á espera de encontrar algo que me surpreenda...Gosto muito de visitar este blog...

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  9. Livro português destas temáticas bom, para mim, só mesmo o da Rosa Pomar. Há outros que comprei e compraria novamente mas nem se aproximam em termos de conteúdo, estética e qualidade da escrita. O que me aborrece mesmo é ver publicado em livro coisas já publicadas no respectivo blog. Sinto-me um bocadinho roubada. Já tentou a editora Marcador? Acho que seria onde o seu livro se enquadraria melhor. Força e boa sorte.

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